quarta-feira, 30 de setembro de 2015

Mylena Cooper, a menina que brincava com os caixões

Mylena Cooper, dona do famoso Crematório Vaticano, no Brasil, pertence à terceira geração de uma família que vive dos serviços funerários. "Em minha casa, a conversa ao jantar sempre foi a morte."
No Sul do Brasil, toda a gente conhece a Crematório Vaticano, uma empresa de serviços funerários com unidades espalhadas pelo Paraná e Santa Catarina, dois dos três estados que constituem a região. Aliás, a empresa é uma referência para o país inteiro e até para o mundo. "Temos reconhecimento global, os estrangeiros visitam-nos e copiam-nos as ideias", diz orgulhosa ao DN a dona da funerária, Mylena Cooper. O sucesso é facilmente explicável: são três gerações de expertise, ou seja, quase cem anos a cuidar dos mortos.
Cooper, um imigrante irlandês no Sul do Brasil, vivia de construir grades de madeira para guardar alimentos quando um dia lhe encomendaram um caixão (por acaso, em inglês, Cooper significa tanoeiro, ou seja, quem constrói barris, tonéis e, porque não, caixões). Habituou-se à ideia, especializou-se e criou uma funerária, a Funerária Cooper, nos anos 1920.
O filho, Edson Cooper, mudou o nome da empresa para Crematório Vaticano, acrescentando--lhe a cremação e importando conceitos como a tanaxoterapia - técnica que retarda a decomposição do corpo - a revoada - uso de pombas brancas no sepultamento - ou a chuva de rosas - soltar pétalas sobre o caixão. Tudo conceitos discutidos na Fiar-Itpa, o conselho internacional para assuntos relacionados com a morte e onde a Crematório Vaticano se faz representar por Edson e pela filha Mylena.
"Tentei fazer uma parceria com a Nasa para levar cinzas para o espaço, serviço habitual nos EUA, mas aqui não resultou, ninguém quer mandar os parentes para longe", diz Mylena, 30 anos, 14 dedicados à empresa.
Nascida no meio de caixões, a jovem empresária cresceu a brincar neles. "Nada mais natural para mim e para os meus primos, afinal, os meus avós, os meus pais, os meus tios todos estavam no ramo, às vezes não havia espaço para guardar os caixões na empresa e a gente escondia-se entre ou dentro deles, no jardim, no meio da casa...", lembra.
O pior era convencer as amigas a alinhar na brincadeira: "Ela tinham algum medo, mas quem tinha mais medo ainda eram as mães, quando as filhas lhes contavam que se escondiam dentro de caixões quando me visitavam."
Por isso, durante um breve período na adolescência, a hoje bem-sucedida empresária teve vergonha da sua atividade. "Mentia quando me perguntavam o que eu ou a minha família fazíamos." Isso passou-lhe depressa: "Afinal, todas as conversas ao jantar em minha casa eram e são sobre a morte, isto é, sobre o trabalho, nada mais natural..." E ela espera que assim continue por futuras gerações. "Não tenho filhos ainda, mas quando os tiver quero vê-los a brincar com caixões e mais tarde a tomar conta da empresa, sem verem a morte como um bicho-de-sete-cabeças ou um mito, como a maioria das pessoas." (DN-Lisboa)

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