“Directores
falam da importância dos políticos para o debate, alegando que a televisão é a
ágora dos tempos modernos. O
comentário político feito por políticos (no activo ou não) tem sido uma aposta
forte e um traço distintivo das televisões portuguesas. A tendência acentuou-se
com a abertura dos canais por cabo, que veio intensificar a presença de
políticos na caixinha mágica. A questão que impera é se são ou não estes
espaços momentos de afirmação e de prolongamento da acção política. Os
politólogos Adelino Maltez e André Freire e a investigadora na área dos media
Felisbela Lopes são unânimes: nenhum político deixa de o ser em momento algum,
muito menos na televisão, e encaram a situação como um prolongamento da acção
política. Felisbela Lopes, pró-reitora da Universidade do Minho, vê o fenómeno
como um “autêntico passaporte para a vida política e vice-versa” e constata que
as televisões “reproduzem o poder dominante através de um grupo muito restrito
de indivíduos”, aquilo a que chama “confraria” composta por elites próximas do
poder. Na
sua opinião, os espaços de comentário, sobretudo os fixos, como o de Marcelo
Rebelo de Sousa na TVI, o de Marques Mendes na SIC e o de Nuno Morais Sarmento
na RTP1, têm o poder de influenciar a agenda e o alinhamento noticioso dos
media e simultaneamente os comentadores, que são na realidade políticos,
conseguem manter-se vivos na política e nos respectivos partidos, marcando uma
posição. Além disso, nos combates políticos (eleições) leva vantagem quem entra
semanalmente na casa das pessoas. Ainda que audiências não correspondam
necessariamente a votos, “quem não é conhecido parte do zero”, sublinha. Para
o director de informação da SIC Notícias, António José Teixeira, a política é
uma actividade nobre, muito importante em democracia, e é por isso natural que
os políticos tenham uma visibilidade significativa no espaço público. “O
interesse das televisões recai em pessoas credíveis, com ideias próprias, com
capacidade de comunicação e os políticos não estão fora deste âmbito. Seria
estranho que estivessem.”
O
politólogo André Freire também fala da presença hegemónica das mesmas ideias e
da fraca abertura das televisões a outras correntes: “Não existe pluralismo
nenhum, sobretudo nos canais generalistas. Tem havido uma sobre-representação
de comentadores políticos ligados ao PSD e ao PS. Mesmo que estes critiquem os
próprios partidos não deixam de os representar”, observa. Segundo o julgamento
do politólogo, esta é a raiz da dificuldade de afirmação de novos partidos no
sistema político português, uma vez que “quem tem visibilidade pode ser ou não
bem-sucedido politicamente, mas quem não tem visibilidade nunca será
bem-sucedido na política”.
Alcides
Vieira, da SIC, assegura que os critérios na escolha dos comentadores não se
prendem com “quotas de representatividade partidária”. Além disso, garante,
estes “não são convidados por representarem o partido A ou o partido B, a
classe C ou a classe D”.
“Representam-se
a si próprios, têm opinião própria, dão a cara pelas suas opiniões e convicções
pessoais, sejam a favor sejam contra o grupo em que política e ideologicamente
se possam situar”, esclarece. O importante, sublinha, é que tenham conhecimento
dos assuntos, acrescentem valor às ideias e tenham capacidade de comunicar.
“São pessoas com conhecimentos especializados e que dominam as questões
políticas, até porque as conheceram por dentro.”
Adelino
Maltez não assina a teoria do desprendimento partidário nas intervenções dos
comentadores, sobretudo em períodos de campanha eleitoral, e ironiza: “Há
alguns que antes de entrarem no ar recebem ou fazem umas chamadas a ministros”,
observa, fazendo referência a Luís Marques Mendes, que tem sido criticado por
anunciar informação em primeira mão no seu espaço de opinião, no jornal da
noite de sábado da SIC. O
antigo presidente social-democrata, que ocupa o segundo lugar no campeonato das
audiências (com uma média de 21,6% de share em 2014), é encarado por muitos
como um porta-voz do governo, que funciona como balão de ensaio para
determinadas medidas. Exemplo de um desses casos aconteceu em Agosto do ano
passado quando anunciou que o PSD estaria a estudar um hipotético aumento do
IVA. Algo a que o CDS viria a opor--se “terminantemente” e que o
primeiro-ministro viria a desmentir mais tarde. Para Maltez o grande problema
dos espaços de opinião em Portugal é pertencerem a políticos quando deveriam
ser ocupados por jornalistas: “Os órgãos de comunicação social caíram na tentação
de entregar o exercício de comentário político a políticos profissionais por
acharem que seria a via mais barata e despacharam os bons jornalistas
editorialistas.”
O
politólogo vai mais longe ao afirmar que existe um processo oculto de controlo
da opinião pública no qual os comentadores são as peças-chave e contesta a
falta de transparência do processo. “O que nos falta são bons jornalistas
comentadores. O comentário político é essencialmente do jornalista de ideias.
Esse é um exercício do bom jornalista e não dos políticos, que não têm noção da
realidade”, comenta, justificando que Marcelo Rebelo de Sousa é líder de
audiências por ser jornalista e não pelas suas características políticas. Por
seu turno, António José Teixeira contrapõe: “Os políticos não têm de ser
apagados do mapa mediático por serem políticos” e assegura que “nem todos andam
à procura de novos lugares na política”. Para
Maltez, a opinião política como se apresenta hoje em dia não é esclarecedora e
só “serve os interesses das direcções”. “É uma ilusão pensar-se que contribui
para o debate entre os cidadãos, até porque as pessoas perdem o interesse
naquilo que já sabem que vai ser dito”, analisa, sublinhando que a maioria
actua por impulso e sem preparação, apenas para influenciar a agenda noticiosa. Alcides
Vieira prefere assinalar o lado positivo da questão. Segundo o director de
informação, nunca como agora se debateu tanto “dentro e fora das televisões”,
isto “graças aos canais de cabo e à internet”. No seu entendimento, o espaço de
debate plural não se resume ao comentário. Realça os avanços nas coberturas em
directo de debates parlamentares e os frente-a-frente, que trouxeram para o
debate público “temas fundamentais que antes estavam escondidos”. Felisbela
admite: sim, os media dizem em que pensar e até como pensar e por isso
contribuem para algum debate. “É melhor haver este debate do que não haver
debate nenhum”, afirma. Contudo, lamenta que este não seja mais diversificado e
especializado” (fonte: Jornal I, com a devida vénia)
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