sexta-feira, 29 de janeiro de 2016

Alerta: campanhas negras invadem redes sociais

A Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) ilibou José Rodrigues dos Santos no caso em que se referiu a Alexandre Quintanilha, deputado do PS, como tendo sido “eleito ou eleita”. O jornalista garante ao i que viu a deliberação com naturalidade e avança que “fontes ligadas a um partido, incluindo dirigentes, informaram que toda a campanha nas redes sociais foi orquestrada pelo seu partido com recurso a perfis falsos para tentar ‘criar’ um escândalo que embaraçasse a RTP” – uma prática que afirma ser “habitual” e que se parece estender a várias áreas, nomeadamente política e futebol.
Para o jornalista é claro que as campanhas negras acontecem com frequência e servem os mais variados interesses, manipulando assim a informação que chega à opinião pública. “Quando há uma decisão de atacar um tema ou uma personalidade, a agência de comunicação ligada a essa organização cria perfis falsos e inunda as redes sociais com ataques virulentos, de modo a criar a impressão de que há uma indignação geral contra essa personalidade ou sobre esse tema. Não há indignação nenhuma, são tudo perfis falsos usados em campanha negra para deliberadamente atingir certos objetivos. Essa campanha virtual, depois, contamina o mundo real, pois algumas pessoas reais, por cumplicidade ou simples tontice, também pegam no assunto”, explica.
Para José Rodrigues dos Santos é evidente que depois dos esclarecimentos que foram feitos, inclusivamente com um pedido de desculpas em direto, “a polémica tornou-se suspeita. Quando as minhas fontes partidárias me explicaram o que realmente se passava, e que tudo tinha sido orquestrado por uma campanha negra com recurso a perfis falsos, fiquei esclarecido”.
O i tentou, sem sucesso, contactar Alexandre Quintanilha, que na altura se sentiu insultado com a confusão entre “eleito e eleita” e chegou a pedir que todos os partidos se pronunciassem.
Política 2.0 Contactado pelo i, Cunha Vaz, presidente e managing partner da Cunha & Associados, explica que estas campanhas negras fazem parte do nosso quotidiano e deviam “ser punidas por lei”. “Claro que existem. Nós não fazemos. Nunca fizemos, mas o que não faltam são casos. Houve uma, por exemplo, quando se questionou se o engenheiro Sócrates era homossexual ou não. É um exemplo”, avança.
 Ao i, uma fonte ligada a um dos partidos políticos recorda quando entrou pela primeira vez numa destas salas, onde cerca de dez secretárias estavam reservadas a este tipo de trabalho. “Era ali que se faziam as intervenções nos fóruns e a criação de perfis falsos para votações online, por exemplo” – uma manipulação da informação que continua a acontecer. “Estas campanhas negras, ao que me esclareceram, envolvem de resto outras técnicas. Por exemplo, as agências de comunicação partidárias aparentemente invadiram também os programas radiofónicos e televisivos de opinião pública. Quando o senhor Manel, agricultor na Lourinhã, liga para esses programas a criticar isto ou aquilo, muitas vezes não é senhor Manel nenhum, é alguém da agência de comunicação ligada a um partido a fazer-se passar por um fictício senhor Manel para criar a impressão de que há uma grande indignação quanto a determinado assunto. Tudo manipulação”, afirma José Rodrigues dos Santos.
A Ascensão de Passos Muito já se falou deste género de campanhas. Por exemplo, uma tese de mestrado de Fernando Moreira de Sá, consultor de comunicação, conta a verdadeira história digital dos bastidores da chegada de Passos Coelho ao poder. Neste trabalho, apresentado na Universidade de Vigo (Galiza), é possível perceber a manipulação de fóruns das rádios e televisões e o condicionamento dos debates. “Sabendo-se da forte presença de jornalistas da área política no Twitter, eram plantados tweets cirúrgicos trazendo para a discussão digital temas caros à candidatura, sublinhando fraquezas do adversário principal e potenciando a mensagem do candidato apoiado, e utilizando como suporte a blogosfera, sem esquecer o Facebook. Não significa que os adversários não fizessem o mesmo. Faziam-no, só que com menos resultados e menor eficácia”, pode ler-se. Mas nem só neste caso existiu o recurso a blogues e perfis de Facebook e Twitter: “Como se tem notado em eleições posteriores, todos os principais partidos (PSD, PS, CDS, PCP e BE) também sabem como funcionam estes meios e no seu seio estão alguns dos melhores especialistas na matéria. Todos, sem exceção, utilizam o mesmo tipo de ferramentas e métodos.”
A título de exemplo, nesta tese aparece ainda explicada a importância que toda esta estratégia teve no resultado final, que culminou com a chegada de Passos Coelho ao poder, em 2010, quando se tornou líder do PSD: “O mais importante, em nosso entender, foi a forma como o acompanhamento nos diferentes fóruns de análise digital decorreu. Nos blogues, no Twitter e no Facebook foi notória a supremacia, tanto em quantidade como em rapidez, das análises publicadas pelos seus apoiantes e a forma como estas influenciaram os diferentes comentadores/jornalistas que acompanhavam o debate nas televisões e as reações na rede.” A culpa morre solteira Para José Rodrigues dos Santos, “o assunto deveria agora passar para o Ministério Público, pois a criação de perfis falsos configura, creio eu, crime de fraude”. Também Cunha Vaz defende que devia existir uma punição, ideia partilhada pela presidência e direção da APECOM – Associação Portuguesa das Empresas de Conselho em Comunicação e Relações Públicas: “A direção a que presido mantém princípios de ética e de transparência intocáveis, pelo que condenamos de forma frontal qualquer tipo de comunicação que procure manipular a opinião pública.”

O i tentou, sem sucesso, contactar o Ministério Público até ao fecho desta edição para perceber se existem queixas desta natureza (aqui)

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