quinta-feira, 11 de junho de 2015

Mistério no Caminho de Santiago. há dois meses e uma semana que ninguém sabe de Denise Theim

"Uma americana desapareceu quando fazia o caminho francês, perto de Léon. As polícias espanholas puseram todos os meios no terreno, mas não há uma única pista.  Denise nunca mais voltou a mexer no dinheiro do banco ou a conectar-se à internet. Passaram dois meses e uma semana e continua a não haver pistas sobre o paradeiro da norte-americana que desapareceu quando fazia o caminho francês de Santiago. Centenas de polícias, militares e voluntários passaram a pente fino as florestas e matas de Léon, em Espanha, sem qualquer sinal da peregrina. A mochila azul turquesa que carregava às costas ou o lenço cor-de-rosa que trazia ao pescoço no domingo de Páscoa, quando foi vista pela última vez, também não apareceram.  Denise Theim, 41 anos, saiu de Phoenix em Dezembro. Tinha acabado de ficar desempregada e decidiu gastar as poupanças numa viagem pelo mundo. Começou por Manila, seguiu para o Camboja, passou por Singapura e voou até França. Paris foi o último destino antes de viajar até Espanha para fazer, sozinha, parte do caminho francês de Santiago. Meses antes, tinha visto o filme “The Way”, em que Martin Sheen é um reputado oftalmologista da Califórnia que viaja para Espanha à procura do filho, morto no Caminho de Santiago durante uma tempestade. No Facebook, Denise anunciou que ia caminhar para se pôr à prova. O irmão, Cedric, contou ao “The Huffington Post” que estava à procura de “equilíbrio”. “Embarcou na viagem para descobrir o que queria fazer da vida e também para conhecer o caminho de que tanto se fala”, recordou.
Caminho sem retorno Denise era rotineira. Começou a caminhar a 6 de Março em Pamplona. Não levou telemóvel e levantou, todas as semanas, a mesma quantia de dinheiro. De quatro em quatro dias, entrava num cibercafé e falava com a família no Skype. Aproveitava também para pôr fotografias e desenhos das etapas nas redes sociais.
No dia 1 de Abril, fez o último levantamento de dinheiro: 50 euros. Três dias depois, apresentou a credencial do peregrino – uma espécie de passaporte que os peregrinos usam nos caminhos de santiago e que é carimbado nas aldeias e vilas por onde passam – no albergue “San Javier”, perto da catedral de Astorga, em Léon. Pagou os nove euros da estadia e, nessa tarde, falou pela última vez, por email, com uma amiga: “Olá a partir de Astorga. Fico contente por teres tido um bom dia, mesmo que o clima não tenha sido perfeito. Planeio ir a Ganso. Disseram-me que tem um bom albergue. Fico contente por saber que o Louis está bem. Vamos arrebitar. Aproveita, DT”, dizia a mensagem. Nessa noite, Denise dormiu no albergue com outros 73 peregrinos. Acordou cedo e tomou o pequeno almoço no café “Gaudi”. À saída, conversou com duas peregrinas e um homem italiano, que aparentava ter 60 anos e estaria a escrever um livro sobre o caminho francês. O grupo perdeu-lhe o rasto na Igreja de Santa Marta, perto da catedral. A etapa que planeava cumprir nesse dia era pequena, apenas 14 quilómetros. Por volta do meio-dia, Denise deveria chegar a El Ganso, uma pequena aldeia onde só há comércio graças ao enorme afluxo de viajantes que, nos últimos anos, têm acorrido ao caminho francês. Mas nunca mais foi vista.  O italiano misterioso A 30 de Abril, ainda sem qualquer pista, as autoridades espanholas conseguiram localizar o homem italiano com quem Denise esteve antes de desaparecer. Giorgio Candoni regressara a Itália em meados do mês e, segundo o jornal “El norte de Castilla”, tem estado a colaborar com as polícias. No entanto, a hipótese de ser suspeito do desaparecimento foi rapidamente descartada. Antes de regressar a Itália, Giorgio publicou fotografias nas redes sociais das várias etapas por onde passou até Santiago. Novo balde de água fria para as autoridades, que mobilizaram para o terreno todos os meios. As buscas estenderam-se a toda a província de Léon e houve dias em que quase uma centena de homens da Guardia Civil e da Policía Nacional palmilharam matas e florestas. O grupo cinotécnico de Zamora entrou em cena, um helicóptero sobrevoou uma área de muitos quilómetros, foi mobilizado o Serviço de Intervenção Rápida da Guardia Civil e centenas de voluntários passaram, e continuam a passar, a zona a pente fino. Nada.
“Não há certezas que nos permitam dar respostas”, admitiu recentemente Teresa Mata, do governo de Léon, ao “El Pais”. Entretanto, o irmão de Denise criou uma página no Facebook – “Help us find Denise” –, onde têm chegado centenas de falsos avistamentos. Há quem garanta ter visto a peregrina americana em Santiago “com os pés doridos” ou em Oviedo a comprar um bilhete de autocarro para Santiago.
Sequestro ou acidente?
O tempo e falta de respostas das autoridades estão a adensar o mistério e há cada vez mais teorias sobre o que terá acontecido a Denise Theim. Uns defendem que teve um acidente e caiu para um lugar inacessível, outros acreditam que se sentiu mal ou sofreu um ataque. Há também quem garanta que morreu intoxicada: em El Ganso há dezenas de letreiros a alertar os peregrinos para não beberem águas das muitas fontes que existem na zona. A americana ignorou os avisos e matou a sede?
Enquanto isso, os jornais vão dando informações contraditórias. Uma fonte da Guardia Civil de Lugo terá contado ao “El País” que as autoridades concentraram esforços em Serria, uma localidade a 154 quilómetros de Astorga e 100 de Santiago, de onde saem muitos peregrinos que querem ganhar a “compostela” – uma espécie de diploma a que têm direito os que conseguem completar 100 quilómetros a pé até Santiago, provando-o com carimbos na caderneta do peregrino. A mesma fonte terá contado que o objectivo passou por encontrar um homem chamado Miguel, que terá atacado duas peregrinas, uma holandesa e uma americana. Nos arredores de Astorga circula outro rumor. Diz-se que terá aparecido uma mochila abandonada, sem documentos, de um homem coreano. “Os coreanos que fazem o caminho têm estado em pânico”, contou ao “El País” Ramiro Rodríguez, dono do bar “Cowboy” em El Ganso. Vários órgãos de comunicação social locais têm relatado supostos episódios de peregrinas que se dizem “assediadas”. E Annie Carvalho, que escreve há anos sobre as rotas de Santiago, alertou no mês passado para os perigos de se caminhar sozinho – algo que é muito comum na Galiza. Em Março, Annie escreveu no seu blogue um post chamado “Problemas entre Astorga e Rabanal del Camino”, em que relata dois assaltos a peregrinos. “Sempre se pensou que o caminho fosse seguro”, escreveu a blogger. “Mas não é preciso ficar paranóico, deve ser-se apenas cauteloso”, recomendou. Com a insegurança no vermelho, as autoridades espanholas têm recebido dezenas de contactos de peregrinos assustados, que relatam avistamentos de “pessoas estranhas”. Em Maio, uma mulher garantiu à polícia que foi alvo de uma tentativa de sequestro na mesma zona em que Denise desapareceu. Mas o jornal “ABC” assegura que a polícia não conseguiu estabelecer ligação entre os dois casos porque o perfil das vítimas é diferente. Seja como for, o “The Guardian” adiantou que as autoridades espanholas estão a recomendar aos peregrinos que atravessam Léon que tenham atenção redobrada, especialmente no troço de 15 quilómetros em que a americana desapareceu há dois meses.  Mais tranquilo parece estar o presidente da junta de Santa Catalina, em Astorga. “Há três anos também desapareceu um peregrino italiano. Procuraram-no durante um mês e meio e afinal estava tranquilamente em Matavanero [uma aldeia abandonada e recuperada na década de 1990 por uma comuna]. Quem sabe o que aconteceu com essa estrangeira? Passam tantos por aqui todos os dias... O que parece óbvio é que o corpo não está caído por aí porque foi procurado por helicópteros, cães, polícias e grupos de 80 e 140 voluntários”, disse recentemente ao “El País”. A família de Denise já pediu ajuda a vários senadores e congressistas americanos para que o caso – que vai deixando de ocupar as páginas dos jornais – não caia no esquecimento. Na semana passada, a polícia espanhola admitiu, pela primeira vez, que as hipóteses de encontrar a peregrina são “escassas” (texto da jornalista do Jornal I, Rosa Ramos, com a devida vénia)

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