A
história de Kamo, uma rapariga supostamente violada e morta na África do Sul,
parecia tristemente real e tinha todos os ingredientes para se tornar viral:
apelava ao coração do leitor, era publicada aos pedacinhos (140 caracteres de
cada vez, não fosse a plataforma escolhida o Twitter) e falava de uma realidade
bem conhecida naquele país. O único problema é que é tudo mentira. Voltemos
a domingo passado, altura em que a utilizadora do Twitter @JustKhuhi, uma jovem
sul-africana desconhecida, começou a contar a chocante história da sua amiga
Kamo. O relato começava assim mesmo, por anunciar que tudo não passava de uma
história, mas a novela, publicada em mais de 70 tweets, fez certamente com que
os leitores que a acompanhavam perdessem o fio à meada e pensassem que era
real.
A
autora da história começa por relatar que conheceu Kamo quando esta tinha 12
anos, porque as mães de ambas se conheciam, e a ligação entre ambas foi
“imediata”, como se fossem irmãs. Depois, durante uma série de cerca de dez
tweets, @JustKhuhi dá pormenores sobre a amizade das duas, aparentemente
inseparáveis. Até ao dia em que Kamo desaparece: família, namorado e amigos
desconhecem o seu paradeiro.
As
descrições da forma como a autora da história procura a amiga, seguindo as
pistas deixadas no seu telemóvel, e a encontra numa cama de hospital após esta
ter sido brutalmente violada são violentas e emocionaram os milhares de
internautas que acompanharam a história. Depois, o choque: Kamo, que tinha
“sonhos enormes que agora nunca poderá cumprir”, acaba por morrer por volta do
tweet número 50. A
internet revoltou-se e reagiu. A hasthtag #RIPKamo foi, nos três dias que passaram,
usada mais de 7 mil vezes no Twitter; o nome da rapariga supostamente violada e
morta foi mencionado quase 60 mil vezes naquela rede social, conta a BBC. As
mensagens de pesar, a que a autora da história replicou com tweets agradecidos,
apareceram em catadupa.
E
não foram apenas os internautas que ficaram chocados e pediram justiça para
Kamo. Houve mesmo representantes governamentais do Departamento das Mulheres
sul-africano a tweetar sobre o caso, cita a BBC: “Por favor, ajudem-nos a
combater a violência contra mulheres e crianças. A história de #Kamo é de
partir o coração”.
A
imprensa também acreditou na tragédia de Kamo. O jornal sul-africano “Star”
dedicou, na sua edição impressa desta segunda-feira, uma peça a Kamo.
Entretanto, reagindo a todo o gozo de que está a ser alvo nas redes sociais, o
editor daquele título Kevin Ritchie disse à News24 que os jornalistas do “Star”
estão “embaraçados e nada contentes”. Para emendar o erro, o jornalista
responsável pela peça entrou em contacto com a autora da história e revelou que
@JustKhuthi é uma jovem de 18 anos de uma cidade no norte da África do Sul que
teve, de facto, uma amiga chamada Kamo que já morreu. No entanto, tudo o resto
foi inventado: “Escrevi a história para mostrar às pessoas quão mau é viver na
África do Sul... Peço desculpa por ter enganado toda a gente”, explicou.
Embora
a história pareça não passar de uma curiosidade, a verdade é que trouxe para a
ordem do dia um assunto demasiado relevante naquele país. De acordo com
estatísticas governamentais citadas pela BBC, entre 2014 e 2015 houve mais de
50 mil queixas por abuso sexual na África do Sul. Foi isso mesmo que muitos
internautas, depois de descobrirem que a história de Kamo era falsa, destacaram (Expresso)
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