A Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) ilibou José
Rodrigues dos Santos no caso em que se referiu a Alexandre Quintanilha,
deputado do PS, como tendo sido “eleito ou eleita”. O jornalista garante ao i
que viu a deliberação com naturalidade e avança que “fontes ligadas a um
partido, incluindo dirigentes, informaram que toda a campanha nas redes sociais
foi orquestrada pelo seu partido com recurso a perfis falsos para tentar
‘criar’ um escândalo que embaraçasse a RTP” – uma prática que afirma ser
“habitual” e que se parece estender a várias áreas, nomeadamente política e futebol.
Para o jornalista é claro que as campanhas negras acontecem com
frequência e servem os mais variados interesses, manipulando assim a informação
que chega à opinião pública. “Quando há uma decisão de atacar um tema ou uma
personalidade, a agência de comunicação ligada a essa organização cria perfis
falsos e inunda as redes sociais com ataques virulentos, de modo a criar a
impressão de que há uma indignação geral contra essa personalidade ou sobre
esse tema. Não há indignação nenhuma, são tudo perfis falsos usados em campanha
negra para deliberadamente atingir certos objetivos. Essa campanha virtual,
depois, contamina o mundo real, pois algumas pessoas reais, por cumplicidade ou
simples tontice, também pegam no assunto”, explica.
Para José Rodrigues dos Santos é evidente que depois dos esclarecimentos
que foram feitos, inclusivamente com um pedido de desculpas em direto, “a
polémica tornou-se suspeita. Quando as minhas fontes partidárias me explicaram
o que realmente se passava, e que tudo tinha sido orquestrado por uma campanha
negra com recurso a perfis falsos, fiquei esclarecido”.
O i tentou, sem sucesso, contactar Alexandre Quintanilha, que na altura
se sentiu insultado com a confusão entre “eleito e eleita” e chegou a pedir que
todos os partidos se pronunciassem.
Política 2.0 Contactado pelo i, Cunha Vaz, presidente e managing partner
da Cunha & Associados, explica que estas campanhas negras fazem parte do
nosso quotidiano e deviam “ser punidas por lei”. “Claro que existem. Nós não
fazemos. Nunca fizemos, mas o que não faltam são casos. Houve uma, por exemplo,
quando se questionou se o engenheiro Sócrates era homossexual ou não. É um
exemplo”, avança.
Ao i, uma fonte ligada a um dos
partidos políticos recorda quando entrou pela primeira vez numa destas salas,
onde cerca de dez secretárias estavam reservadas a este tipo de trabalho. “Era
ali que se faziam as intervenções nos fóruns e a criação de perfis falsos para
votações online, por exemplo” – uma manipulação da informação que continua a
acontecer. “Estas campanhas negras, ao que me esclareceram, envolvem de resto outras
técnicas. Por exemplo, as agências de comunicação partidárias aparentemente
invadiram também os programas radiofónicos e televisivos de opinião pública.
Quando o senhor Manel, agricultor na Lourinhã, liga para esses programas a
criticar isto ou aquilo, muitas vezes não é senhor Manel nenhum, é alguém da
agência de comunicação ligada a um partido a fazer-se passar por um fictício
senhor Manel para criar a impressão de que há uma grande indignação quanto a
determinado assunto. Tudo manipulação”, afirma José Rodrigues dos Santos.
A Ascensão de Passos Muito já se falou deste género de campanhas. Por
exemplo, uma tese de mestrado de Fernando Moreira de Sá, consultor de
comunicação, conta a verdadeira história digital dos bastidores da chegada de
Passos Coelho ao poder. Neste trabalho, apresentado na Universidade de Vigo
(Galiza), é possível perceber a manipulação de fóruns das rádios e televisões e
o condicionamento dos debates. “Sabendo-se da forte presença de jornalistas da
área política no Twitter, eram plantados tweets cirúrgicos trazendo para a
discussão digital temas caros à candidatura, sublinhando fraquezas do
adversário principal e potenciando a mensagem do candidato apoiado, e
utilizando como suporte a blogosfera, sem esquecer o Facebook. Não significa
que os adversários não fizessem o mesmo. Faziam-no, só que com menos resultados
e menor eficácia”, pode ler-se. Mas nem só neste caso existiu o recurso a
blogues e perfis de Facebook e Twitter: “Como se tem notado em eleições
posteriores, todos os principais partidos (PSD, PS, CDS, PCP e BE) também sabem
como funcionam estes meios e no seu seio estão alguns dos melhores
especialistas na matéria. Todos, sem exceção, utilizam o mesmo tipo de
ferramentas e métodos.”
A título de exemplo, nesta tese aparece ainda explicada a importância
que toda esta estratégia teve no resultado final, que culminou com a chegada de
Passos Coelho ao poder, em 2010, quando se tornou líder do PSD: “O mais
importante, em nosso entender, foi a forma como o acompanhamento nos diferentes
fóruns de análise digital decorreu. Nos blogues, no Twitter e no Facebook foi
notória a supremacia, tanto em quantidade como em rapidez, das análises
publicadas pelos seus apoiantes e a forma como estas influenciaram os
diferentes comentadores/jornalistas que acompanhavam o debate nas televisões e
as reações na rede.” A culpa morre solteira Para José Rodrigues dos Santos, “o
assunto deveria agora passar para o Ministério Público, pois a criação de
perfis falsos configura, creio eu, crime de fraude”. Também Cunha Vaz defende
que devia existir uma punição, ideia partilhada pela presidência e direção da
APECOM – Associação Portuguesa das Empresas de Conselho em Comunicação e
Relações Públicas: “A direção a que presido mantém princípios de ética e de transparência
intocáveis, pelo que condenamos de forma frontal qualquer tipo de comunicação
que procure manipular a opinião pública.”
O i tentou, sem sucesso, contactar o Ministério Público até ao fecho
desta edição para perceber se existem queixas desta natureza (aqui)
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