quinta-feira, 30 de julho de 2015

Buraco do comboio de Oeiras é de 26 milhões, mas prejuízos vão ser maiores

O Sistema Automático de Transporte Urbano (SATU) de Oeiras, mais conhecido por comboio-fantasma de Isaltino Morais, registou um buraco de 26 milhões de euros no final de 2012, valor já superior ao investimento total realizado, mas os prejuízos podem vir a ser muito mais elevados. Quem o diz é o Tribunal de Contas (TdC), numa auditoria aos exercícios de 2008 a 2012 da empresa municipal criada em 2001 para gerir o SATU – que começou a funcionar em 2004 e foi oficialmente extinta em Agosto de 2014 – e fez a sua ultima viagem de 1,2 km a 31 de Maio. “O desmantelamento e remoção das infra-estruturas de transporte e equipamentos circulantes poderá envolver elevados encargos financeiros, tal como sucedeu com o mono-rail de Sydney [que foi a inspiração do ex-presidente da câmara ] com 3,6 km de extensão de linha [...] e cujo encargo de desmantelamento foi superior a 11 milhões de dólares australianos”, alertam os auditores no relatório.
Câmara com posições opostas
O próprio município de Oeiras, quando impugnou o despacho da ministra das Finanças – de 29 de Agosto de 2014, que decretou o fim da empresa –, admitiu que “a dissolução comportará graves prejuízos para o interesse público, como sejam ‘os custos de desactivação e eventual desmantelamento do sistema SATU, que recairão na esfera da despesa pública’”. Uma posição diametralmente oposta à que foi assumida pelo próprio presidente da câmara, Paulo Vistas, na 4.a sessão extraordinária da assembleia municipal, realizada a 20 de Abril de 2015 – em que foi apreciada e deliberada a dissolução da SATU-Oeiras –, quando chegou a garantir que “a câmara não vai despender um euro, contrariamente a muitos outros sistemas que hoje consomem do erário público milhões”, lê-se no relatório de auditoria. Os juízes do TdC fazem ainda referência ao que Paulo Vistas declarou naquela assembleia: “É claro que o sistema [de transporte], comigo, não tem como funcionar sem empresa, o sistema está encerrado e é simples: o material circulante ficará parado, a infra-estrutura está lá e quando houver uma solução e essa solução, enquanto eu for presidente, terá que ser consensual. Se nunca chegarmos a um consenso, fica lá.” O Tribunal não tem dúvidas, porém, de que, “não sendo dado célere destino às respectivas infra--estruturas, material circulante e respectivos inventários, rapidamente se deteriorarão e degradarão, pelo que, por razões ambientais, se tornará necessária a sua manutenção ou, em alternativa, o seu desmantelamento”. “O que coloca claramente o problema do seu custo e impacto financeiro nas contas individuais do município, mas também nas contas consolidadas do grupo municipal”, avisam os auditores.
Governo negociou fundos Outra das conclusões que se podem retirar do relatório do TdC é que o secretário de Estado dos Transportes, Sérgio Monteiro, esteve a negociar a possibilidade de a empresa se candidatar a financiamento comunitário para assegurar a sua viabilidade já depois de a ministra das Finanças ter decretado a dissolução da empresa. 
“Face à circunstância, aparentemente contraditória, de, por um lado, ter sido requerida a dissolução oficiosa da empresa [...] e de, por outro, estarem a decorrer iniciativas com o apoio da Secretaria de Estado dos Transportes no sentido de ser assegurado o financiamento necessário à viabilidade da empresa”, o Tribunal questionou Sérgio Monteiro. A resposta do chefe de gabinete foi a seguinte: “O projecto SATU é desde o seu início da exclusiva responsabilidade do município de Oeiras e a secretaria de Estado sugeriu que a Câmara de Oeiras analisasse a eventual exequibilidade de financiamento do projecto no quadro 2014-2020, sujeita naturalmente à demonstração da viabilidade e do cumprimento dos requisitos aplicáveis para a boa consecução do projecto”. Foi só depois do exercício do contraditório e dos trabalhos da auditoria que a Câmara de Oeiras reconheceu “a indisponibilidade de fundos comu- nitários para financiamento do projecto”. Entre 2008 e 2012, o número médio de passageiros transportados por dia foi de 551, correspondendo a 1,5 passageiros por percurso do SATU, ou seja, pouco mais de 1% do total da capacidade de cada carruagem. O Tribunal emitiu por isso “um juízo de censura pública” a Isaltino Morais e aos vários responsáveis que passaram pela empresa. Dos 48 citados, só 44 exerceram o direito de contraditório (Jornal I, texto do jornalista JOÃO D'ESPINEY )

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